quarta-feira, 6 de junho de 2012

Um dos motivos para minha implicância com Clarice

Na faculdade tinha uma menina linda, mas linda demais, popular, inteligente, loira, sabe como? Invejável, claro. Mas eu não era invejosa, acho incrível isso de mim, visto assim de longe - sério. Se fosse, pode ter certeza que, 20 e tantos anos depois, admitiria. Enfim: ela era louca por Clarice Lispector. Artista, pessoa sensível, delicada e com tempo de sobra, no final do ano ela fez cartões personalizados para praticamente todos os outros 59 colegas da turma, todos com uma ilustração e um textinho de sua autora favorita, escolhidos dependendo da personalidade ou do sentimento que o colega/amigo inspirava. O meu cartão tinha esse texto:

Cisne

Mas foi no vôo que se explicaram seus braços compridos e desajeitados: eram asas. E o olho um pouco estúpido, aquele olhar estúpido só combinava com as larguras do pensamento pleno. Andava mal no diário, mas voava. Voava tão bem que até parecia arriscar a vida, o que era um luxo. Andava ridículo, cuidadoso, o pato feio. No chão, ele era um paciente.


Nossa, como odiei. Ela e Clarice Lispector. Levei alguns meses pra assimilar bem a ofensa. Quem nasce pra pato não chega a cisne. NÃO FORÇA.

(admito que já vinha de antes minha implicância com Clarice e suas frases bíblicas começando com "E isso", "E aquilo..")


PS: A quem perguntou, eu não disse nada à moça não, aliás, agradeci o cartão, fui educada e tentei ver "a beleza" do texto, achei que estava vendo coisas, sendo exagerada. Ou seja, estúpida mesmo. 

16 comentários:

Verônica disse...

detesto Clarice Lispector. fim. e acho um crime quando alguém insiste em campará-la com Mrs. Woolf.

Cristiane Rangel disse...

Nunca tive opinião formada sobre a Clarice. Sei lá, nunca fedeu, nem cheirou. Mas esse trecho é pacabá! Eu teria arquitetado vingancinha, sério.

Raquel (NY) disse...

E precisa de mais motivos?
Eu comprei a tal biografia que o americano escreveu assim que saiu mas nao consegui acabar. Acho que ha um erro de pontuacao no titulo, o correto seria "Why this, world?"

Camila disse...

Nunca entendi a adoração coletiva, que chega ao fanatismo. Hermética demais às vezes, chata na maior parte do tempo, taí uma escritora por quem eu passo batido.

. disse...

Eu tinha vontade de tentar traçar a fucking genealogia do maldito hype. Pra saber de onde saiu isso, de tudo é Clarice.

A grande serventia desse tipo de comportamento de manada sensível é que eu posso rir do bando de imbecil passando recibo de ignorante, repassando por aí texto do Saramago falando que filho é presente de Deus. "Oi, eu NUNCA LI um texto do Saramago", as postagens urram. Gente reaça pra caralho e homofóbica repassando supostas lindas palavras do Caio F. Abreu. Eu rio dessa gente trouxa quando a raiva passa.

Verô, cê me jura que o povo faz essa comparação?
Puta. merda.

Raiza disse...

Porra,isso que foi insultar com classe.

Deise Luz disse...

Não gosto da obra de Clarice, não é meu tipo de literatura e me dá preguiça, mas acho ela uma figura interessante, como disse lá no último post do meu blog.

Fiquei com raivinha dessa sua colega. Primeiro pelo texto antipático que mandou pra você. Segundo pela própria ideia de escrever os cartões mesmo. Gente, 59 colegas! É simpatia ou, sei lá, fofura demais pro meu gosto.

Verônica disse...

Faz sim, Deborah. Inclusive já vi essa mesma comparação sendo feita por coleguinhas professores de literatura e por alguns professores da academia.

Rita disse...

Adoro Clarice, virei fã desde a faculdade quando li os contos do livro Laços de Família. A Imitação da Rosa, pra mim, é um texto apaixonante e me fez prestar mais atenção no que ela escrevia (antes eu só tinha lido trechos avulsos). Depois li alguns romances dela, mas ainda prefiro os contos. Estou lendo a biografia dela, essa mencionada pela Raquel, e estou adorando (apesar de me incomodar um pouco com certas observações que o cara faz sobre o Brasil, mas vá lá). Vou lendo e ficando com vontade de reler os livros dela e de correr pra ler os que ainda não li. E sei que a Tina me ama - não é legal? :-)

Quanto à comparação entre Clarice e Woolf, acredito que ela se deva basicamente ao uso do tal "fluxo da consciência", recurso que as duas adotavam com frequência. E na literatura ocidental elas foram as duas mulheres que primeiro se destacaram no uso dos tais monólogos que vão e voltam, como nosso pensamento - e que eu adoro, tanto nela como no pouco que li de Woolf. Li agora na biografia de Clarice que quando seu primeiro romance foi lançado, Perto do Coração Selvagem, alguns críticos mencionaram suposta influência de Joyce, pelo uso do mesmo recurso, o que ela prontamente negou. As comparações com Woolf, contudo, são mais recorrentes mesmo. Honestamente, não acho heresia, não.

Agora, essa amiga aí, Tina, sei não, viu. Cruzes.

Dé, morro de rir com "Saramago" por aí. :-D

Beijocas
Rita

Tina Lopes disse...

Gente, eu achei que todo mundo fosse me chamar de doida mal agradecida, que ser o cisne é legal... então vocês me entendem <3 e olha só, o post é sobre mim, tsá? não sobre a Clarice. FOCO!

Rita disse...

Observo que a palavra que você usa é "implicância". :-)

Então, amore, sobre você: fiquei bem curiosa em saber o que você falou pra tal lá do cisne.

Juliana disse...

coleguinha FDP essa sua, hein!=p Também quero saber o que vc disse pra moça!

Ah, e assino embaixo do que a Rita disse sobre a Clarice.

Marissa Rangel-Biddle disse...

Mocinha mooooooooonstra! Peguei nojo dela, Tina. Da moça. Gosto de Clarice.

Anônimo disse...

nossa, eu achei perfeito pra vc...essa menina é muito observadora kkkkkk
bj te amo
tua irmã

Geide Miguel disse...

Pelo trecho que a garota escolheu - e lendo seu blog - acho que a fulana já sabia que vc era mais inteligente que ela. E o contrário de vc não conteve a inveja...

Unknown disse...

Assim como Fernando Pessoa, Clarice é a maior das "Deusas" da Literatura, inconcebível, ou melhor, acho que ela pede muito pouco pra ser entendida, mas o que ela requer é ALMA... Quando não se sabe o que é isso, fica difícil mesmo. Na verdade, ela te fez um elogio ENORME, mas você passou batido...